28Março2024

  
  

Segurança & Defesa

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S&D Entrevista o Gerente-geral do Grupo EADS no Brasil, Eduardo Marson

No início de junho, Segurança & Defesa teve a oportunidade de entrevistar, por meio de seu editor, Mário Roberto Vaz Carneiro, o Sr. Eduardo Marson (foto), gerente-geral do Grupo EADS no Brasil. 

S&D — Em primeiro lugar, gostaria que você falasse um pouco sobre a EADS.

Eduardo Marson — A EADS é o resultado de um movimento intenso de fusões e aquisições ocorrido na Europa nas décadas de 80 e 90. É a resposta européia ao grande budget de defesa americano. É difícil a uma empresa concorrer sozinha, quanto mais num mercado multi-facetado, como era o europeu. A EADS reflete a própria tendência da União Européia. Basicamente, três grandes grupos formam a EADS hoje. O lado francês (SOGEADE) tem 30,1%, originários do grupo Lagardère — a Aerospatiale Matra —, mais uma participação do governo francês; o lado alemão (DaimlerChrysler), também com 30,1%, é oriundo da DaimlerChrysler Aerospace AG, a antiga DASA; e o lado espanhol (SEPI), que detém 5,5%, é basicamente composto pelo governo espanhol, juntamente com a antiga CASA-Construcciones Aeronáuticas S.A.. O restante, 34,3%, é público e está no mercado de capitais.

S&D — E quanto à presença da EADS no Brasil?

Eduardo Marson — Aqui no Brasil a empresa já está presente há 26 anos, enquanto sócia da Helibras, juntamente com a Aerospatiale e, posteriormente, Eurocopter. Temos ainda uma participação próxima a 6% na Embraer, e isso nos faz um player antigo no mercado brasileiro. A EADS Brasil é a responsável pela coordenação estratégica do grupo no país. Está sob nossa responsabilidade todo o posicionamento estratégico do grupo. Aqui nós não somos uma estrutura de vendas, e sim uma estrutura de marketing e estratégia. Nossa função primordial é manter o relacionamento institucional com os nossos clientes — no setor militar, as três Forças Armadas.

S&D — Nesse esquema, onde entram as business units da EADS?

Eduardo Marson — O papel da EADS Brasil é manter o canal de comunicação com o cliente absolutamente “azeitado”. Ficamos atentos a qualquer movimentação das nossas business units (Eurocopter, etc.) para que não haja qualquer comprometimento institucional da empresa por alguma ação delas. Devemos ter uma ação coordenada perante o governo brasileiro. Quando dizemos ao governo, por exemplo, que a política da EADS é aumentar os investimentos no país, aumentar sua presença, isso reflete um posicionamento institucional do grupo como um todo, e não o posicionamento da MBDA ou da Eurocopter, por exemplo. Estipulada a política, nós a circulamos pelas Business Units, para que todos falem a mesma língua.

S&D — Você poderia dar um exemplo concreto do que significaria esse aumento de presença?

Eduardo Marson — Claro. Veja por exemplo a declaração do presidente da Eurocopter, no sentido de que quer aumentar as compras no Brasil. Por uma questão lógica não é possível nacionalizar mais os helicótperos da Helibras, pois já se atingiu o máximo índice de nacionalização possível nesse momento. Mas nada impede que busquemos outros fornecedores para as linhas mundiais da Eurocopter. Então não se trata de aumentar o índice de nacionalização do produto, mas sim de aumentar a participação do Brasil na linha da Eurocopter como um todo. Passar a comprar partes, peças e até serviços, pois a engenharia brasileira é extremamente competente, para fornecimento para toda a linha da Eurocopter. Isso é parte de uma política formulada pela EADS de maior participação no Brasil, e de maior inserção do Brasil nesse nosso bid mundial.

S&D — Você poderia falar um pouco sobre a presença da EADS no mercado de defesa brasileiro, em termos de equipamentos?

Eduardo Marson — Somos fornecedores das três Forças Armadas. E para certos itens a situação é extremamente interessante. Em termos de helicópteros, por exemplo; nas três Forças, nossas máquinas são majoritárias em relação às dos nossos concorrentes. Em termos de mísseis acontece algo parecido; embora forneçamos paras as três Forças, somos particularmente fortes na área da Marinha do Brasil. Todos os mísseis que a MB utiliza hoje são de fabricação da MBDA, que por sua vez é o resultado de uma joint venture entre a EADS, a Finmeccanica e a BAE. Embora seja uma participação tripartite, a liderança do marketing no Brasil e em 90% do planeta é da EADS.

S&D — Quais programas a EADS tem em andamento com a FAB?

Eduardo Marson — Além do programa VCX, o avião presidencial, com contrato já assinado e em andamento (entrega do avião está prevista para dezembro), temos dois outros, ambos da EADS-CASA: o C-295 e a modernização do P-3. Os contratos estão negociados com o cliente, já estão “congelados”, não se mexe mais, estão rubricados e só falta assinar. Só não estão assinados por uma questão administrativa, a Lei de Responsabilidade Fiscal. É a mesma situação de um outro contrato que temos com a MB. A EADS-CASA tem uma grande tradição no mercado latino americano. No Chile por exemplo, há pouco tempo suas aeronaves completaram 25 nos de uso, houve celebrações, etc. O Brasil é o único país da América Latina onde os aviões da EADS-CASA não estão presentes. Então estamos esperando os acontecimentos em Brasília, pois trata-se de uma questão político-administrativa: tem que passar pelo Congresso, etc.

S&D — A concorrência pelo CLX foi acirrada. A que você atribui a vitória do C-295?

Eduardo Marson — Em vários setores, a EADS está na crista do desenvolvimento. É o caso da Airbus, que ultrapassou seu concorrente principal porque sua tecnologia está um passo adiante. O mesmo acontece com o C-295. Trata-se de uma plataforma que, na área dos turboélices de transporte militar, está na crista do desenvolvimento tecnológico. O C-295 é hoje, indiscutivelmente, o melhor produto em sua categoria.

S&D — E quanto ao FX?

Eduardo Marson — Nosso interesse específico no projeto FX diz respeito ao sistema de armas. Embora tenhamos participações no capital da Dassault e no capital da Embraer, não temos muita interveniência no FX propriamente dito, pois a liderança é da Embraer. Mas estamos olhando com muito carinho a possibilidade de vender o sistema de armas ar-ar da MBDA, o MICA. É um míssil BVR extremamente interessante para a força. Como pode usar cabeças de guiamento diferentes, radar e infra-vermelho, o seu oponente pode saber que você tem o MICA, mas não sabe de que tipo, o que dificulta as contramedidas e/ou a evasão.

S&D — Está sendo oferecido à FAB algum míssil ar-superfície?

Eduardo Marson — Não, no momento não estamos oferecendo nenhum armamento ar-superfície à FAB. Estamos nos concentrando no MICA.

S&D — E quanto à Marinha?

Eduardo Marson — Na Marinha estamos com um contrato pendente para a remotorização dos AM39 Exocet, contrato esse já rubricado e negociado, e que está aguardando autorização para ser assinado, o que esperamos aconteça nos próximos dias. Estamos discutindo com a MB, embora ainda num estágio bem mais primário, a solução de guerra A/S e A/Sup com o helicóptero Cougar. Os mesmos argumentos que usamos hoje para batalhar por uma solução brasileira no FX eu usaria para falar no Cougar. Hoje ele é um helicóptero maduro, que está presente nas três Forças, portanto tem massa crítica no país. Agora está presente também na área civil, como Super Puma Mk.2, na Petrobras — já existem três máquinas operando offshore, sem contar alguns Mk.1 ainda em uso. Já existe então uma massa crítica de Super Puma, e uma empresa nacional chamada Helibras que pode agregar valor na montagem final aqui, e na manutenção. E mais do que isso: a própria Eurocopter já declarou que, aproveitando a massa crítica de Super Pumas aqui no Brasil, talvez valha a pena pensar numa linha Super Puma no país, para atender a América Latina. Logicamente, isso ainda depende do crescimento dessa massa crítica. Estamos fazendo um esforço técnico muito grande junto à MB. Aliás, a MB teve oportunidade de ver o Cougar nessa versão no Chile, e achamos que num país onde as dificuldades são grandes, o melhor caminho é o da a “standardização” e o de uma solução local.

S&D — A EADS está oferecendo à MB alguma solução para a defesa antiaérea do NAe São Paulo?

Eduardo Marson — Não iniciamos ainda o movimento para oferecer alguma coisa para a defesa antiaérea do São Paulo. O que ocorreu foi o seguinte: temos duas áreas na EADS – Defence Electronics (DE) e a Defence & Communications Systems (DCS) — que foram totalmente reformuladas nesse início de ano, tanto em termos físicos como em termos de equipe. Por conta dessa reformulação tivemos que segurar um pouco tudo que é relacionado com guerra eletrônica, sistemas antiaéreos, aquisição de alvos, etc. Além disso, embora muita gente esteja falando na repotencialização do São Paulo, não vemos como a Marinha possa lançar no momento um projeto dessa magnitude. Nossa idéia é, a partir de algumas visitas que o pessoal da DE e da DCS está fazendo ao Brasil nos últimos meses, lançar um programa interno para começar a estudar a possibilidade de oferecer soluções à Marinha.

S&D — E que tipo de soluções seriam essas?

Eduardo Marson — Lógico que do ponto de vista de mísseis vamos continuar oferecendo à MB toda a nossa gama de produtos. Somos o único fornecedor de mísseis para a MB — quando eles foram comprados eram de fabricantes diferentes —, e não temos intenção de perder pessa condição. Temos uma gama enorme de possibilidades, desde dos novos Blocks do Exocet até, por exemplo, o VL Mica. Podemos até dizer que conhecemos bem o São Paulo, e suas possibilidades. A MB está falando da modernização dos aviões, que seria prioritária. Ficou tanto tempo sem investimentos que hoje tudo é prioridade, o que também acontece com a Força Aérea. Para a MB. estamos estudando, entre outros, programas ligados a eletrônica, defesa de área, etc. Hoje, a EADS está caminhando para um approach de solução total. Qual é a necessidade do cliente? Determinamos isso e então oferecemos um pacote, no qual podem entrar as áreas de DE, de DCS, de mísseis, de helicópteros, etc. Essa é talvez a grande novidade desse desenho da EADS. Ela funciona como um integrador dessa total solution. E podemos até integrar produtos de outros fabricantes. Não temos problema algum quanto a isso.

S&D — E em relação ao Exército?

Eduardo Marson — O contrato de fornecimento de helicópteros Cougar para o EB está praticamente terminando, embora obviamente esteja em andamento o contrato de offset. Estamos empenhados em vendas adicionais de helicótperos Super Puma para o Exército, ainda dentro da mesma concorrência. Tudo ainda depende de budget, mas trata-se de uma necessidade operacional real, pois diante do advento da Brigada de Operações Especiais o deslocamento passa a ser crítico, e atualmente o Exército só tem os helicópteros em Taubaté e Manaus. Não estamos negociando com o EB nenhum contrato novo, mas sim fazendo é uma grande parceria.

S&D — E como você descreveria essa parceria?

Eduardo Marson — A EADS não está aqui para ações de curto prazo. Afinal, como eu disse, já estamos há 26 anos no mercado brasileiro. O que fizemos foi assinar um Memorando de Entendimento com a Imbel, e isso faz parte de nossa estratégia de longo prazo. Muitos pensaram que isso estaria diretamente “amarrado” à venda ao EB na viatura 8x8 da Patria. Mas nossa idéia não é essa, pois esse veículo não é algo que o Exército possa imediatamente adquirir. A idéia é criar uma base industrial no Brasil, até mesmo antes do EB poder adquirir esses veículos. Estamos pensando em exportação, e não fazendo um programa e esperando que amanhã o EB venha a comprar uma quantidade enorme dessas viaturas de uma só vez. Estramos investindo no mercado, e esse é o conceito de nossa parceria com a Imbel. É um investimento a longo prazo.

S&D — Qual a abrangência desse MdE?

Eduardo Marson — O MdE cobre uma série de áreas que estamos investigando para identificar em que áreas em que podemos atuar conjuntamente. É um memorando genérico de apoio comercial mútuo, de transferência de tecnologia. A EADS criou o conceito, identificou o parceiro nacional credível perante o cliente — no caso o EB —, que tem a boa vontade do EB, que precisa de desenvolvimento sob todos os aspectos, que está passando por uma transformação — porque a nova administração está imponto um outro ritmo, está totalmente empenhada em colocar a Imbel no Século 21. Fizemos uma parceria estratégica. Claro que os players dessas parcerias serão nossas Business Units. Cabe a cada uma de nossas Business Units definir os campos específicos de cooperação. Apenas como exemplo, a MBDA poderá eventualmente achar que a Imbel é interessante para produzir uma linha de mísseis, ou a nossa área de defesa eletrônica pode achar que a Imbel tem capacidade para nacionalizar alguns produtos para o mercado brasileiro. Logicamente, no momento em que estamos atuando junto ao cliente e as informações começam a passar por nossa estrutura, isso ajuda a retroalimentar as equipes de vendas das nossas Business Units.

S&D — E já foi definida alguma dessas áreas de cooperação?

Eduardo Marson — Já identificamos uma muito palpável. Na DCS temos uma área de rádios policiais, redes digitalizadas e criptografadas, para uso policial. É o sistema Tetrapol, com o qual já temos em andamento um projeto com a Polícia Federal. Identificamos na Imbel, na Fábrica do Rio de Janeiro, no Caju, a possibilidade de nacionalizar essa tecnologia, ao longo de um período de tempo.

S&D — Qual seria o papel da Imbel nesse caso?

Eduardo Marson — Num primeiro momento a Imbel tem capacidade de montar esses rádios no Brasil, prestar assistência técnica (fundamental para a atividade policial), e ao longo do tempo ir nacionalizando a tecnologia. Não só para o Brasil mas também para outros países onde o Brasil tenha algum tipo de vantagem competitiva. Esse é um exemplo de ação a curto prazo. O item é pequeno, mas os números não são tão pequenos. Só a PF, por exemplo, tem sete a oito mil homens, a Polícia de São Paulo tem cem mil homens, a de Minas Gerais tem quarenta mil, e por aí vai. Essa diversificação para segurança pública é um nicho importante, porque reduz a dependência da EADS de receitas vindas de aviação civil e do setor militar. Hoje, por exemplo, a EADS está desenhando uma solução para a segurança das Olimpíadas de Beijing, e como esse temos uma série de projetos.

S&D — E sobre o blindado AMV, da Patria, o que você poderia dizer?

Eduardo Marson — Esse é um ponto interessante, pois de uma certa forma eu me considero “o pai da criança” no que concerne ao Brasil. Quando eu entrei na EADS, em fevereiro-março de 2003, estava se falando da família de blindados do EB. Coincidiu que naquele momento a EADS estava adquirindo uma participação na Patria, uma empresa estatal finlandesa, uma Imbel da Finlândia, extremamente bem sucedida — não só na área de blindados, mas também por exemplo na área de aeronáutica (a caixa do radar Erieye dos R-99A é fabricada pela Patria, que também produz uma parte do cone de cauda do 145 e partes do A380). A EADS estava em negociações com os governos nórdicos para os programas dos helicópteros NH90 e do Tiger, e como parte dos offsets desses programas, foi adquirido aproximadamente 27% da Patria. Verifiquei que a Patria tinha um veículo 8x8, o AMV, que estava com ótimas chances de ganhar o maior programa de aquisição de blindados em andamento naquela ocasião no mundo, na Polônia (que eventualmente ganhou, para o fornecimento de 690 exemplares). Juntei dois mais dois. Tive a felicidade de encontrar um gerente de marketing da Patria que morou cinco anos no Brasil, fala português, adora o Brasil. Ele tinha até participado quando, em 1999, o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento convidou algumas empresas para uma apresentação do ROB (Requisito Operacional Básico — Editor) inicial desse projeto (Fiat Iveco, Santa Barbara, etc.). Usando minha experiência no mercado brasileiro, comecei a montar uma idéia para que não se cometesse os erros do passado. Por exemplo: determinei que tinha que haver produção no Brasil, país que tem uma longa tradição nesse setor. Há gente qualificada, até com condição de melhorar o projeto. O projeto está na crista de tecnologia, tem enorme potencial de desenvolvimento/upgrades, e já mostrou sua vantagem competitiva. As provas na Polônia foram duríssimas, mas para você ter uma idéia , no primeiro mês de testes o Pátria não trocou nenhum pneu, e o mais próximo concorrente trocou doze.

S&D — E a idéia de abrir uma linha do AMV no Brasil?

Eduardo Marson — O Brasil passa por um momento difícil, e não podemos montar uma base industrial para atender somente o EB. Estamos pensando então em atender, a partir do Brasil, os países com os quais o Brasil tenha relacionamento privilegiado. Não há uma definição de área, é uma questão de determinar onde o Brasil tem uma vantagem comercial. Como você sabe, trouxemos um AMV ao Brasil, ele foi testado pelo Exército e a avaliação inicial foi muito boa. Até no Lago Paranoá ele entrou. Achamos o parceiro correto, a Imbel, que é hoje a depositária do acervo tecnológico da Engesa, o que é importante. Além disso, a Imbel está num processo de revitalização dos Cascavéis e Urutus, o que lhe dá experiência no manuseio desse tipo de programa. E gostaria de frisar uma coisa: o projeto não está fechado para ninguém. Como estamos num estágio primário, ainda não temos uma negociação objetiva com ninguém, mas até pelo fato da EADS ser uma empresa naturalmente cooperativa, quanto mais massa crítica pudermos agregar no Brasil, melhor. Mas o nosso parceiro prioritário é a Imbel.

S&D — O que você quer dizer com a EADS ser “naturalmente cooperativa”?

Eduardo Marson — O fato de sermos uma empresa formada da cooperação internacional facilita muito, pois a EADS não é identificada com um determinado país. Ela nasceu da cooperação franco-alemã no final da década de 60 e início dos anos 70, que gerou entre outros o consórcio Airbus, e depois a Eurocopter. Todos os projetos de ponta da EADS hoje em dia são feitos na base da cooperação. Veja o exemplo do A400M. Cada um dos países que se comprometeu a comprar a aeronave tem uma participação. O próprio A380, veja de quantos lugares do mundo vem partes dele. Hoje a EADS tem uma participação grande até nos EUA. A American Eurocopter é um exemplo. Nossa operação dos EUA é a única que tem uma holding, a EADS North America. É por isso que hoje somos a segunda empresa do mundo. E, com nosso faturamento de 30 bilhões de euros, estamos bem próximos dos 40 bilhões de dólares da Boeing.

S&D — Onde entraria a participação sul-africana no programa do AMV “brasileiro”?

Eduardo Marson — O envolvimento da África do Sul não surgiu à toa. É que a EADS tem um relacionamento muito bom com a Denel, que por sua vez tem um perfil semelhante ao da Imbel. Até a venda do Gripen para a África do Sul, a BAE estava negociando com o governo sul-africano a eventual aquisição de uma parcela minoritária da Denel. Depois, a BAE resolveu declinar e saiu do circuito. O governo da África do Sul então convidou a EADS para analisar a possibilidade de uma parceria estratégica, que pode resultar na compra de uma parcela minoritária do capital da Denel. Hoje estamos nessa fase. No setor de defesa, nenhuma empresa isolada consegue sobreviver. Da mesma forma que a Denel e a Patria percebem que precisam de uma aliança estratégica que lhes permita o acesso à tecnologia, que lhes possibilite repartir custos de pesquisa e desenvolvimento, que lhes dê acesso ao mercado internacional, acesso ao mercado financeiro, etc., também o nosso Memorando com a Imbel — de uma outra forma, sem participação acionária —, permite à empresa brasileira circular nesse meio de uma maneira mais consistente.

S&D — E qual seria a colaboração da Denel?

Eduardo Marson — Nossa idéia é um projeto cooperativo. Quem faz torretas hoje no mundo? Oto Melara, Delco, General Dynamics, Denel e poucas outras. A África do Sul é um país do mesmo tipo que o Brasil, no qual o Brasil tem um tremendo interesse. A África do Sul tem atualmente um requisito de viatura 8x8, e a Denel produz torretas de qualidade, que podem ser integradas ao Patria 8x8. Além disso, existe o eixo Brasil-África do Sul-Índia (IBSA, ou India-Brazil-South Africa), que é politicamente correto. Então, isso pode estar dentro de um acordo multilateral. A idéia é interessante, aparentemente tem uma engenharia conveniente, aparentemente faz sentido, mas ainda há muito trabalho pela frente, e quando você tem que considerar o elemento humano não pode nunca ter 100% de certeza. A maior vantagem que temos hoje é ter um veículo no topo da tecnologia. A Patria tem grande experiência em blindados, e o seu 6x6, o XA, está presente em missões de paz em vários lugares, como Eritréia e Kosovo, e já foi provado em combate. •